Como evitar a doença gordurosa do fígado


Escrito originalmente pelo Dr. Michael Greger M.D. FACLM em 19 de Fevereiro de 2019. Publicado originalmente aquiTraduzido e adaptado por João Madureira.


Crédito da imagem: Max Pixel

No documentário Supersize Me, Morgan Spurlock alimenta-se exclusivamente no McDonald’s durante um mês, e, como seria de prever, o seu peso, tensão arterial e colesterol sobem, além das suas enzimas do fígado, um sinal de que as suas células hepáticas estavam a morrer e a despejar os seus conteúdos no fluxo sanguíneo. A sua experiência individual foi na realidade formalmente replicada. Um grupo de homens e mulheres aceitaram comer duas refeições de fast food por dia durante um mês. A maior parte dos valores dos seus fígados começou normalizado, mas em apenas uma semana, a maioria estava fora dos parâmetros, indicando um aumento patológico dos danos no fígado.

O que estava a acontecer era doença hepática gordurosa não-alcoólica (NAFLD), a próxima epidemia global, como discuti no meu vídeo Como prevenir doença hepática gordurosa não-alcoólica. A acumulação de gordura no fígado resulta num espectro patológico que vai desde a deposição assimptomática de gordura, até à esteato-hepatite não-alcoólica (NASH), que pode levar à cirrose, e pode resultar em cancro hepático, insuficiência hepática, e morte.

A NAFLD é agora a causa mais comum de doença crónica hepática nos EUA, afectando cerca de 1 em cada 3 adultos. O consumo de fast food é uma óptima forma de a provocar, pois está associada com o consumo de refrigerantes e carne. Beber uma lata de refrigerante por dia pode aumentar as probabilidades de ter NAFLD em 45%, e as pessoas que comem 14 nuggets de galinhas por dia têm o triplo das taxas de fígado gordurosa, comparados com os que comem 7 nuggets ou menos. 

Tem sido caracterizada como uma história de gordura e açúcar, mas evidentemente nem todos os tipos de gordura são iguais. Descobriu-se que as pessoas com fígado gorduroso comiam mais gordura animal e colesterol, e menos gordura vegetal, fibra e antioxidantes. Isto pode explicar porque a aderência a uma alimentação de estilo mediterrâneo, caracterizada por um alto consumo de alimentos como frutos, vegetais, cereais integrais, e leguminosas, está associada com doença hepática gordurosa não-alcoólica menos grave. Também se pode dever à presença de fitonutrientes específicos como as antocianinas, pigmentos roxos, vermelho e azuis, encontrados em frutos vermelhos, uvas, ameixa, couve-roxa, cebolas roxas, e radicchio. Estes alimentos ricos em antocianinas são promissores na prevenção de fígado gorduroso, mas isso baseia-se principalmente em experiências em placas de Petri. Houve um ensaio clínico que descobriu que beber uma bebida de batata-doce roxa pareceu ser eficaz para evitar a inflamação do fígado.

Uma alimentação mais baseada em vegetais também pode melhorar o nosso microbioma, as boas bactérias do nosso intestino. “Somos o que comemos” é o antigo ditado, mas a versão moderna poderia ser “somos o que as nossas bactérias comem”. Quando comemos gordura, podemos facilitar o crescimento de más bactérias, o que pode libertar moléculas inflamatórias que aumentam a permeabilidade do intestino e contribuir para a doença hepática gordurosa.

A doença hepática gordurosa também pode ser causada por sobrecarga de colesterol. Pensa-se que o colesterol alimentar encontrado em ovos, carne, e lacticínios oxida e aumenta a actividade do receptor X alfa do fígado, que pode aumentar a actividade de algo chamado SREBP, que pode aumentar o nível de gordura no fígado. Os cristais de colesterol, por si só, levam os glóbulos brancos humanos a despejar compostos inflamatórios, de maneira semelhante à forma como os cristais de ácido úrico causam a doença da gota. Pode ser isso que desencadeia a progressão desde o fígado gorduroso até à hepatite séria: “a acumulação de concentrações suficientes de colesterol livre dentro dos hepatócitos esteatósicos [células gordas do fígado] causando cristalização do colesterol”. Isto é uma de várias linhas recentes de evidência que sugerem que o colesterol alimentar tem um importante papel no desenvolvimento da hepatite gordurosa — ou seja, inflamação do fígado gorduroso.

Num estudo de 9.000 adultos americanos, seguidos durante 13 anos, os pesquisadores demonstraram uma forte associação entre a ingestão de colesterol alimentar e a hospitalização e morte por cirrose e cancro do fígado, pois o colesterol alimentar pode oxidar e causar efeitos tóxicos e carcinógenos. Para limitar a toxicidade do excesso de colesterol proveniente da alimentação, o fígado tenta libertar-se do colesterol, despejando-o na corrente sanguínea. Portanto, medindo o colesterol não-HDL do sangue, é possível prever o início de doença hepática gordurosa. Se subtrairmos o HDL do colesterol total, nenhum das centenas de pacientes seguidos que tinham um valor abaixo de 130 desenvolveram a doença. As companhias farmacêuticas veem a doença hepática gordurosa não alcoólica como uma benesse, “tal como é o caso de qualquer doença decorrente de uma maior capacidade financeira… considerando que tem uma prevalência alta e tendência para subir….e de necessitar de tratamento farmacológico contínuo”, mas talvez evitá-la seja tão fácil como alterar a nossa alimentação, evitando alimentos doces de cheios de colesterol.

“A verdade inconveniente é que a NAFLD poderia quase ser considerada o equivalente humano de foie gras (em francês, “fígado gorduroso”). No entanto, à medida que comemos demais e “obrigamo-nos a ingerir” alimentos que podem resultar em implicações sérias para a saúde, uma tal textura amanteigada nos fígados humanos não será bem-vinda pelos hepatologistas na prática clínica.”




Para mais sobre quão maus os açúcares adicionados pode ser para nós, vê:
Para mais sobre como quão mau o colesterol pode ser, vê:
Com saúde
Michael Greger, M.D.


PS: Se ainda não o fez, pode subscrever os meus vídeos gratuitos aqui e ver a última apresentação de final de ano:
Artigo traduzido por João Madureira. Lê o livro do Dr. Greger, "Como Não Morrer" (PT) ou "Comer Para Não Morrer" (BR). Em Portugal está também disponível um livro de receitas, também chamado "Como Não Morrer"

Conhece os 12 alimentos a consumir diariamente ou segue-nos e fala connosco na nossa página do Facebook.  Vê também o nosso grupo de discussão.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

A Dúzia Diária

O Arroz Preto e o Vermelho são melhores que o Arroz Castanho (“integral”), que por sua vez é mais Saudável que o Arroz Branco

A Resposta a um Mistério do Cancro Colorretal