Porque há tanta corrupção comercial na nutrição
Escrito originalmente pelo Dr. Michael Greger M.D. FACLM a
27 de Junho de 2019. Publicado originalmente aqui. Traduzido e adaptado por João Madureira.
Crédito da imagem: Pixabay
A prevalência de doenças crónicas tal como a diabetes tem subido muito, tal
como o número de artigos publicados sobre diabetes nos jornais médicos. “Por
que razão toda a riqueza do nosso conhecimento académico não se traduz
mais diretamente em melhorar a condição humana?” Talvez o nosso apego à
mentalidade reducionista, que foi tão bem-sucedida com doenças agudas de
deficiências, seja na realidade um obstáculo ao sucesso na batalha contra a
doença crónica.
Nesta altura, parece que a saúde está reduzida a
uma mercadoria altamente comercializada, em que somos alvo de marketing de
todos os tipos de exames e tratamentos de alto custo e alta tecnologia, de
valor duvidoso e com riscos substanciais associados. “Isto é preocupante porque
a maior parte das coisas que nos dão saúde são baratas e em grande parte
disponíveis sem ajuda profissional ou marketing.” Isto não quer dizer que a
medicina moderna não possa fazer milagres, mas e quanto a uma perspectiva mais
abrangente? Ou seja, e quanto aos 80% de mortes e deficiências causada por
doenças relacionadas com a alimentação?
E quanto ao campo da nutrição? No meu vídeo Por que é a nutrição tão comercializada?, discuto como a
nutrição passou a ter a ver com lucros e produtos, e a extração
de nutrientes de alimentos intactos de modo a que possam ser re-empacotados e
anunciados. Mas a comida é melhor quando ingerida intacta. Coma brócolos e
mirtilos, não um suplemento qualquer “brócomirtilos”. Mas a razão pela qual não
há mais estudos em alimentos intactos é bastante óbvia: Não se podem patentear.
Porque iria uma empresa gastar
imenso dinheiro, tempo e esforço para convencê-lo a comer brócolos quando
qualquer outra empresa lhe pode vender o mesmo produto? É por isso que o campo
da nutrição pode ter a ver mais com o marketing de
produtos lucrativos do que com a educação das pessoas sobre os fundamentos da
saúde e do bem-estar. Por exemplo, os benefícios dos cereais integrais em vez
de cereais refinados são muitas vezes atribuídos apenas à fibra, o que permite que
a indústria alimentar crie Froot Loops (cereais muito açucarados) com fibra
acrescentada, deixando o consumidor com a sensação que fez uma boa escolha.
Consideremos este estudo engenhoso: Burkitt e os colegas pensaram que o facto que as
taxas extraordinariamente baixas de doenças mortais crónicas na África
Sub-Sahariana se deviam aos alimentos vegetais não processados que faziam parte
da sua alimentação.
Isto deu origem à hipótese da fibra, a ideia reducionista de que a fibra deve
ser o ingrediente único e mágico. E se colocarmos isto à prova? E se comparamos
dois grupos de mulheres mais velhas, que ingerem ambos 6g de fibra de cereais
por dia, mas num dos grupos proveniente sobretudo de cereais integrais, e no
outro grupo sobretudo de cereais refinados? Quem acha que viveu mais tempo? Se
fosse apenas a fibra a fazer efeito, não deveria haver muita diferença, pois
ambos os grupos ingeriam aproximadamente o mesmo valor. De facto, o grupo de
vegetais integrais viveu mais tempo e com uma taxa de mortalidade
significativamente menor, o que significa que o efeito se pode dever a todas as
outras coisas maravilhosas nos alimentos vegetais não processados “relacionados
com a fibra, que podem conferir importantes benefícios de saúde muito para além
da própria fibra”. É por isso que não seria de esperar que suplementos de apenas
fibra tivessem o mesmo benefício.
De facto, a comida, não os nutrientes, é a
unidade fundamental na nutrição.
Como o Dr. David Katz notou, “A nossa cultura não quer ouvir dizer que o ingrediente activo dos brócolos são os
próprios brócolos — quer saber que suplemento tomar.”
(todos os vídeos abaixo indicados dispõem de legendas em português
disponíveis nas opções)
Este artigo é parte de uma série sobre a “armadilha reducionista”, que
inclui:
- Reducionismo e a mentalidade da deficiência
- Resposta da indústria a “plantas, não comprimidos”
- Será que a teoria da fibra está errada?
No entanto, A regra da fibra “5 para 1” continua válida, pois é uma
indicação de quão fortemente processado um produto é.
Há dois lados relativamente ao argumento da propriedade intelectual, no que
diz respeito à comida. Exploro ambos em Plantas como propriedade intelectual: patentemente errado?.
E, claro, esta é a razão porque sempre recomendo Tomar responsabilidade pessoal pela sua própria saúde.
Pela sua saúde,
Michael Greger, M.D.
PS: Se ainda não o fez, pode subscrever os meus vídeos gratuitos aqui e ver a última apresentação de final de ano:
- 2016: Como Não Morrer: O Papel da Alimentação na Prevenção, Paragem, e Reversão das Nossas 15 Doenças Mais Mortais. (legendas disponíveis nas opções do filme)
Artigo traduzido e adaptado por João Madureira. Lê o livro do Dr. Greger, "Como Não Morrer" (PT) ou "Comer Para Não Morrer" (BR). Em Portugal está também disponível um livro de receitas, também chamado "Como Não Morrer"
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