A Resposta a um Mistério do Cancro Colorretal
Escrito originalmente pelo Dr. Michael Greger M.D. FACLM em
8 de Agosto de 2019. Publicado originalmente aqui. Traduzido e adaptado por João Madureira.
Crédito da imagem: Wikimedia Commons
O cancro (ou câncer) colorretal é a
terceira causa mais comum, a nível mundial, de mortalidade por cancro.
Felizmente, as boas bactérias no nosso intestino utilizam a fibra que comemos e
produzem
ácidos gordos de cadeia curta, como o butirato, que nos protegem do cancro. Nós
cuidamos delas, elas cuidam de nós. Se não fizermos nada às células de cancro
colorretal, elas crescem. É isso que o cancro faz. Mas se expusermos as células
do cancro colorretal à concentração de butirato que as nossas boas bactérias
produzem no intestino quando comemos fibra, esse crescimento pára abruptamente.
Se, no entanto, deixarmos de aplicar butirato, se comermos de forma saudável um
dia e depois não fornecermos fibra no dia seguinte, o cancro pode voltar a
crescer. Idealmente, portanto, temos de comer muitos alimentos ricos em fibra –
ou seja, alimentos vegetais inteiros – todos os dias.
E quanto às populações, como na África sub-Sahariana dos tempos modernos,
onde não se come muita fibra, mas no entanto é raro haver cancro
colorretal? Tradicionalmente, costumavam comer muita fibra, mas agora a sua
alimentação centra-se em farinha de milho altamente refinada, que é pobre em
fibra – e no entanto continuam com baixas taxas de cancro colorretal. Porquê?
Isto foi explicado
pelo facto de que, embora possam ter carência de factores protectores como a
fibra, também não consomem muitos factores promotores do cancro como a proteína
e gordura animal. Mas será que têm mesmo carência de factores protectores?
Se medirmos
o pH das suas fezes, as populações negras na África do Sul têm pH baixo, o que
significa fezes ácidas. Isso é uma coisa boa, que pode explicar as taxas baixas
de cancro. Mas, esperem um pouco. O pH baixo do colón é causado por ácidos
gordos de cadeia curta, que são produzidos pelas nossas boas bactérias quando
comemos fibra, mas eles não comiam mais fibra, sugerindo que havia outra coisa
para além da fibra que estava a alimentar a sua flora intestinal. E, de facto,
apesar de uma baixa ingestão de fibra, as bactérias no seu cólon continuavam a produzir
ácidos gordos de cadeia curta em grandes quantidades. Mas se as suas bactérias
não estavam a alimentar-se de fibra, de que se alimentavam elas? De amido
resistente. “O método de cozinhar e comer a farinha de milho como uma papa resulta
num aumento do amido resistente, que age no nosso cólon da mesma forma que a
fibra,” sendo um pré-biótico, ou seja um alimento que as nossas boas
bactérias usam para produzir esses mesmos ácidos gordos de cadeia curta, que
previnem o cancro.
O “amido resistente é qualquer amido… que não é digerido
e absorvido no intestino delgado, e que, portanto, passa para o intestino
grosso”, o nosso cólon, para alimentar as nossas boas bactérias. Quando cozemos
amidos e deixamo-los arrefecer, parte do amido pode recristalizar para uma
forma resistente às nossas enzimas digestivas. Portanto, podemos obter amido
resistente comendo amidos arrefecidos, tais como salada de massa italiana,
salada de batatas, ou papa de farinha de milho fria. “Isto pode explicar as
grandes diferenças em taxas de cancro colorretal”. Assim, afinal eles estavam
mesmo a alimentar
as suas boas bactérias, mas apenas com muito amido em vez de fibra. “Consequentemente,
uma alimentação rica em hidratos de carbono (carboidratos) pode atuar da mesma
forma que uma alimentação rica em fibra.” Visto que uma pequena fracção dos
hidratos de carbono chega ao nosso cólon, quanto mais hidratos de carbono
comermos, mais butirato as nossas bactérias intestinais podem produzir.
De facto, os países onde as pessoas comem
mais amido têm taxas mais baixas de cancro colorretal, portanto a fibra pode
não ser o único factor protector. Apenas cerca de 5% do amido chega ao
cólon, comparado com 100% da fibra, mas comemos até 10 vezes mais amido que
fibra, portanto pode potencialmente desempenhar um papel significativo em
alimentar a nossa flora intestinal.
Assim, a protecção do cancro que os Africanos usufruem
pode ser dupla: uma alimentação rica em amido resistente e baixa em produtos de
origem animal. Apenas comer mais amido resistente não é suficiente. A carne
contém ou contribui para a produção de presumíveis carcinógenos, como os
compostos N-nitroso. Um estudo
dividiu pessoas em 3 grupos: um numa dieta de baixo teor de carne, outro numa
dieta de alto teor de carne, incluindo vaca, porco, e aves, e o terceiro grupo
na mesma dieta de alto teor em carne mas com muito amido resistente adicionado.
Os dois grupos ricos em carne apresentaram nas suas fezes 3 vezes mais desses
presumíveis carcinógenos e o dobro do amoníaco, em comparação com o grupo de
baixo teor de carne, e a adição do amido resistente não pareceu ajudar muito.
Isto confirma que a “exposição a estes compostos aumenta com a ingestão de
carne,” e 90% são criados no intestino. Portanto pouco interessa se consumimos
carne fresca não-curada e sem nitrosaminas; estas nitrosaminas são criadas a
partir da carne à medida que passam pelo cólon. Isto “pode ajudar a explicar a
maior incidência de cancro colorretal em populações que consomem carne”, assim
como o aumento do amoníaco – nenhum dos quais pôde ser melhorado pela simples
adição de amido resistente.
“Os efeitos deletérios dos produtos de origem animal no metabolismo
colónico sobrepôem-se
ao efeito potencialmente benéfico de outros nutrientes protectores.” Portanto,
devemos fazer uma combinação de menos carne e mais alimentos vegetais inteiros,
assim como exercício, não só para o nosso cólon, mas também para a nossa saúde
em geral.
(todos os vídeos abaixo indicados dispõem de legendas em português,
acessíveis nas opções do vídeo)
Isto é o seguimento do meu vídeo A Teoria da Fibra Estará Errada?.
Isto é o seguimento do meu vídeo A Teoria da Fibra Estará Errada?.
O que é exactamente o butirato? Vê:
- Guerras do Intestino: Sulfeto de Hidrogénio vs. Butirato
- Pre-bióticos: Cuidar do Nosso Jardim Interior
- Tratando a Colite Ulcerosa com a Alimentação
- Aumentando as Boas Bactérias no Cólon Sem Pro-bióticos
Sobre optimizar a flora intestinal, vê:
- Microbioma: A História Interior
- Qual é o Teu Enterotipo do Microbioma Intestinal?
- Como Mudar o Teu Enterotipo
- Disbiose Intestinal: Matando de Fome os Nossos
Micróbios
- Como Reduzir a Produção de Ácidos Biliares
Carcinógenos
- Efeito da Sucralose (Splenda) no Microbioma
Interessado em saber mais sobre a prevenção do cancro colorretal? Vê:
- Matando à Fome o Cancro com Restrição da Metionina
- pH das Fezes e Cancro Colorretal
- Resolvendo um Mistério do Cancro Colorrectal
Se nos alimentarmos de forma saudável, precisamos de uma colonoscopia? Descobre
mais em Será que Deveríamos Todos Ter Colonoscopias a partir dos 50 Anos de Idade?.
Quando o amido normal é cozinhado e depois arrefecido, parte do amido
recristaliza, formando amido resistente. Por esta razão, salada fria de
macarrão pode ser mais saudável que macarrão quente, e a salada de batata pode
ser mais saudável que uma batata assada. Descobre mais no vídeo Fazendo com que o Amido Siga o Caminho de Maior Resistência.
Pela sua saúde,
Michael Greger, M.D.
PS: Se ainda não o fez, pode subscrever os meus vídeos gratuitos aqui e ver a última apresentação de final de ano:
- 2016: Como Não Morrer: O Papel da Alimentação na Prevenção, Paragem, e Reversão das Nossas 15 Doenças Mais Mortais. (legendas disponíveis nas opções do filme)
Artigo traduzido e adaptado por João Madureira. Lê o livro do Dr. Greger, "Como Não Morrer" (PT) ou "Comer Para Não Morrer" (BR). Em Portugal está também disponível um livro de receitas, também chamado "Como Não Morrer"
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